Em Rio Claro, as leis parecem ter uma função mais decorativa que obrigatória. Quem acompanha o imbróglio do Instituto de Previdência do Município (IPRC) já se acostumou com o enredo: decisões judiciais ignoradas, interpretações criativas de reeleições e um silêncio institucional que chega a doer os ouvidos.
Agora, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) foi claro como água de mina: rejeitou mais um recurso do IPRC e reafirmou — pela enésima vez — que o superintendente está no cargo de forma irregular. O motivo? Ele já esgotou o limite legal de reconduções, mesmo que a turma jure de pés juntos que renúncias, eleições de fachada ou leis remendadas permitiriam mandatos infinitos.
A Auditora Silvia Cristina Monteiro Moraes não deixou dúvidas em sua decisão. Escreveu com todas as letras que essa tese não cola — e que a lei municipal não autoriza mais de uma recondução. Parece óbvio? Pois é. Mas no IPRC, o óbvio precisa ser redigido em despacho oficial, publicado no Diário Oficial e, mesmo assim, costuma ser solenemente ignorado.
A situação beira o teatro do absurdo. De um lado, o TCE-SP determina nova eleição para o cargo. Do outro, o superintendente se mantém firme na cadeira, bancando o estadista previdenciário em entrevistas, como se nada tivesse acontecido.
E o que faz a Prefeitura? Nada. A Câmara? Menos ainda. O prefeito, que foi notificado para organizar nova eleição, parece ter considerado o prazo de 30 dias apenas uma “sugestão de amigo”. Já o Legislativo municipal, que deveria fiscalizar, faz questão de não ver, não ouvir e não falar — um clássico “Clube do Bolinha” institucional que protege quem deveria cobrar.
Enquanto isso, quem paga essa conta é o servidor municipal, que tem um instituto atolado em déficit, com repasses atrasados em mais de R$ 11 milhões, um comitê de investimentos com composição irregular e transparência digna de uma caverna sem iluminação. Mas a gestão insiste em vender a narrativa de que está tudo bem — e que qualquer crítica é coisa de imprensa “sensacionalista”.
Quem responderá pelos atos de um suposto superintendente irregular? Aposentadorias, pensões, contratos? Quem? E veja bem: o uso do modo subjuntivo aqui serve justamente para deixar claro que não há certeza — e só isso já seria motivo suficiente para a abertura de um novo processo eleitoral. Um instituto que administra uma reserva de R$ 1 bilhão não pode operar na “dúvida”. É inadmissível.
O problema não é só o IPRC
Essa história expõe mais do que as manobras de um dirigente previdenciário para se perpetuar no poder. Ela escancara uma cultura política de desobediência institucional que trata decisões judiciais como opinião, leis como enfeite e o contribuinte como bobo.
O TCE-SP já alertou, reiterou, despachou, publicou. E vai continuar fazendo isso. Mas sem vontade política para cumprir as ordens, não adianta nada. É como se o Tribunal jogasse petecas para um time que se recusa a entrar em quadra.
Em vez de respeitar o papel do controle externo, a Prefeitura e a Câmara preferem sustentar a farsa. E essa cumplicidade — sim, é o nome certo — é o que mantém o superintendente onde está. Não adianta culpar apenas quem se agarra à cadeira; é preciso olhar para quem segura o banquinho.
Em uma cidade séria, diante de decisões tão claras, a Prefeitura organizaria imediatamente nova eleição para o cargo. A Câmara cobraria explicações do Executivo e abriria investigação sobre o descumprimento da lei. O superintendente, diante da ilegalidade consolidada, entregaria o cargo e deixaria que a autarquia retomasse um mínimo de legitimidade.
Mas isso exigiria que as instituições locais colocassem o interesse público acima de interesses pessoais ou alianças políticas. E esse, por aqui, parece ser o maior dos embargos — o embargo moral.
O Portal Archa seguirá cobrando. Porque cumprir a lei não é favor — é obrigação.
> Nota de transparência: O Portal Archa é um blog-noticiário local que se limita a publicar, de forma integral ou resumida, despachos e decisões oficiais proferidas por órgãos de controle externo, como o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Parte do conteúdo é editado com o uso automatizado de ferramentas de inteligência artificial, sempre com base em documentos públicos e verificáveis, para ampliar o acesso à informação.
