Estudo denuncia falta de transparência e uso político das emendas parlamentares

Apesar da retórica institucional que cerca o planejamento público, uma prática silenciosa e cotidiana segue minando a efetividade e a equidade orçamentária no Brasil: o uso clientelista das emendas parlamentares. É o que mostra o artigo “Orçamento Público Municipal: Análise da Destinação de Emendas Parlamentares no Município de Manaus (2022–2025)”, publicado em julho de 2025 na Revista Acadêmica Online, com base em uma investigação crítica das Leis Orçamentárias Anuais (LOAs) da capital amazonense.

Assinado por sete pesquisadores de diferentes instituições públicas, o estudo traz uma constatação direta: as emendas parlamentares operam como instrumentos de capital político individualizado, dissociadas de critérios técnicos e blindadas por uma arquitetura institucional que dificulta o controle social e a transparência ativa.

Utilizando uma metodologia qualiquantitativa, a pesquisa analisou as LOAs de quatro anos (2022 a 2025) e mapeou como os vereadores de Manaus têm manejado os recursos públicos sob o pretexto de atender demandas locais. Na prática, o que se vê é um orçamento fragmentado, guiado mais por interesses eleitorais do que por prioridades coletivas.

“O descompasso entre o previsto na legislação orçamentária e a forma como as emendas são efetivamente aplicadas reforça uma lógica patrimonialista e personalista, típica de estruturas clientelistas”, alertam os autores.

Fragmentação e opacidade: uma combinação tóxica

Além do uso político das emendas, o estudo denuncia um grave déficit de transparência: as informações sobre valores empenhados, beneficiários e áreas de aplicação estão dispersas em múltiplas plataformas, dificultando qualquer tentativa de controle social por parte da população.

A ausência de um sistema integrado de prestação de contas e de indicadores de impacto torna as emendas um território institucional opaco e propício a barganhas.

A fragmentação também aparece como resultado direto desse modelo: recursos públicos são diluídos em pequenas ações, reformas localizadas e eventos pontuais — iniciativas de alta visibilidade, mas de baixa relevância estrutural para o desenvolvimento urbano e social.

Emendas que servem a poucos, custam caro a muitos

O estudo mostra que, embora as emendas sejam legalmente previstas como parte do processo orçamentário democrático, na prática se tornaram moeda de troca política, concentradas nas mãos de vereadores com maior influência ou proximidade com o Executivo. O princípio da impessoalidade é substituído por arranjos informais de poder e influência, muitas vezes legitimados por discursos de proximidade com a comunidade.

Esse padrão reforça desigualdades, impede planejamento de médio e longo prazo e reproduz um ciclo de dependência e desinformação na gestão pública.

Por um novo pacto orçamentário

Como proposta, os autores defendem:

  • A institucionalização de critérios técnicos e transparentes para destinação de emendas;
  • A publicação unificada, acessível e em tempo real dos dados orçamentários relacionados às emendas;
  • E a integração das emendas à lógica do planejamento de políticas públicas estruturantes, rompendo com a lógica do favor e do marketing eleitoral.

Mais do que uma análise local, o estudo aponta para uma crise nacional na governança democrática do orçamento: quando os instrumentos de emenda são sequestrados pelo clientelismo e blindados contra o escrutínio público, o orçamento público deixa de ser público — e passa a ser privado por outros meios.


Referência
NASCIMENTO, Kethelen Sthephanie do Santos et al. Orçamento Público Municipal: Análise da Destinação de Emendas Parlamentares no Município de Manaus (2022–2025). Revista Acadêmica Online, v.11, n.58, p. 01–20, 2025. DOI: 10.36238/2359-5787.2025.V11N58.1516.

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