SUS desigual: estudo revela distorções estruturais entre entes federados na alocação de recursos para a saúde

Apesar de ser um sistema universal por princípio, o SUS opera na prática com profundas desigualdades regionais e institucionais que comprometem sua equidade e sustentabilidade. É o que mostra a monografia “Sistema Único de Saúde (SUS): despesas com saúde e desigualdade entre os entes federados”, defendida por Carolina Soares Henriques no Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A pesquisa revela que, mesmo após mais de três décadas de institucionalização do SUS, o financiamento da saúde pública no Brasil ainda está preso a lógicas perversas de concentração de recursos, insuficiência federativa e descontinuidade política, o que amplia a disparidade de acesso e qualidade entre estados e municípios.

O que a autora descobriu?

Com base em dados oficiais do Tesouro Nacional, IBGE e Ministério da Saúde, Henriques analisou a participação de União, estados e municípios no financiamento do SUS ao longo dos últimos anos e observou um fenômeno preocupante: a crescente municipalização das responsabilidades sem o devido repasse de recursos pela União, o que sobrecarrega os entes locais — sobretudo os mais pobres — e compromete a qualidade dos serviços prestados.

“O subfinanciamento estrutural e a fragmentação dos repasses aprofundam as desigualdades regionais e colocam em xeque o princípio da integralidade da atenção à saúde”, aponta a autora.

A análise inclui ainda comparações entre unidades da federação, demonstrando que o gasto per capita com saúde varia drasticamente entre estados, sendo influenciado por fatores como capacidade de arrecadação própria, pressão demográfica, presença de hospitais de referência e articulação política local.

Entre a descentralização e a desigualdade

Embora o SUS tenha sido desenhado como um sistema descentralizado, a autora mostra que essa descentralização, sem mecanismos efetivos de redistribuição, agrava as assimetrias históricas entre regiões ricas e pobres. Municípios com menor capacidade administrativa e orçamentária acabam dependendo de convênios pontuais, emendas parlamentares e programas temporários — o que compromete o planejamento de longo prazo.

O estudo também destaca a fragilidade dos mecanismos de coordenação federativa, que deveriam garantir equidade entre os entes, mas frequentemente operam com base em lógicas clientelistas, descontinuidades institucionais e baixa transparência na alocação dos fundos.

Propostas e caminhos

Ao final do trabalho, Henriques propõe:

  • Revisão dos critérios de repasse do Fundo Nacional de Saúde, com foco em critérios populacionais, epidemiológicos e territoriais;
  • Adoção de indicadores de desempenho regionalizados, para ajustar a alocação conforme vulnerabilidades específicas;
  • Fortalecimento do pacto federativo da saúde, com instâncias deliberativas mais vinculantes e participativas;
  • E revisão da EC 95/2016, que instituiu o teto de gastos e aprofundou o subfinanciamento do setor.

Referência
HENRIQUES, Carolina Soares. Sistema Único de Saúde (SUS): despesas com saúde e desigualdade entre os entes federados. Monografia (Bacharelado em Saúde Coletiva) – Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), 2024.

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