A implementação de políticas públicas no Brasil depende menos de decisões isoladas e mais da capacidade de articulação entre União, Estados e Municípios. Essa é a principal conclusão do Trabalho de Conclusão de Curso “A implicação das relações intergovernamentais do federalismo na implementação de políticas públicas”, de Luísa Karassawa Herzberg, apresentado à Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Unesp, campus de Franca.
O estudo analisa como o modelo federativo brasileiro, especialmente após a Constituição de 1988, redefiniu a forma de organizar e executar políticas públicas nas áreas sociais. A chamada descentralização política e fiscal ampliou a autonomia de Estados e Municípios, mas também criou um sistema complexo de competências compartilhadas, que exige cooperação permanente entre os diferentes níveis de governo.
Segundo a autora, a Constituição de 1988 rompeu com a lógica centralizadora do passado ao reconhecer os Municípios como entes federativos e ampliar suas responsabilidades na execução de políticas públicas, especialmente em áreas como saúde, educação e assistência social. No entanto, essa autonomia não se sustenta apenas no plano formal. Para que políticas públicas sejam efetivas, é indispensável que haja capacidade financeira compatível com as atribuições constitucionais de cada ente.
O trabalho demonstra que o federalismo brasileiro combina autonomia e interdependência. Embora não exista hierarquia entre os entes federativos, a execução de políticas públicas ocorre em um ambiente de responsabilidades compartilhadas, no qual a União exerce papel normatizador e redistributivo, enquanto Estados e Municípios assumem a implementação direta das ações. Essa dinâmica se manifesta de forma clara nos sistemas nacionais de políticas públicas, como o Sistema Único de Saúde (SUS), o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e o Sistema Nacional de Educação.
A pesquisa dedica atenção especial à dimensão fiscal do federalismo. A autora destaca que a autonomia política perde sentido quando não é acompanhada de recursos financeiros suficientes. Por isso, mecanismos como transferências constitucionais obrigatórias, fundos vinculados e percentuais mínimos de investimento em saúde e educação são fundamentais para garantir a execução das políticas públicas e reduzir desigualdades regionais.
Outro ponto central do estudo é a análise das competências comuns previstas na Constituição. Nessas áreas, todos os entes federativos têm responsabilidade simultânea, o que exige coordenação institucional e definição clara de papéis. A ausência dessa coordenação pode gerar sobreposição de ações, conflitos federativos ou omissão estatal, comprometendo a concretização dos direitos sociais assegurados constitucionalmente.
O trabalho também aborda a intervenção federal como mecanismo excepcional de preservação do pacto federativo. Embora a regra seja a autonomia dos entes, a Constituição autoriza a intervenção quando há descumprimento de obrigações constitucionais, como a aplicação dos percentuais mínimos em saúde e educação. Nesse sentido, a intervenção não é vista como violação da autonomia, mas como instrumento de garantia dos direitos fundamentais.
Nas conclusões, a autora afirma que o federalismo brasileiro impõe desafios permanentes à formulação e à execução de políticas públicas. A descentralização ampliou a democracia e aproximou a gestão pública das realidades locais, mas também tornou indispensável o fortalecimento das relações intergovernamentais. Sem cooperação efetiva, coordenação institucional e equilíbrio financeiro entre os entes, o modelo federativo tende a produzir desigualdades e ineficiência na entrega de políticas públicas.
Referência
HERZBERG, Luísa Karassawa. A implicação das relações intergovernamentais do federalismo na implementação de políticas públicas. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Franca, 2025.
