Estudo alerta: punir gestor público sem prova de intenção pode gerar injustiça e insegurança jurídica

Um gestor público pode ser punido por improbidade administrativa sem que fique claro se ele agiu com intenção de cometer irregularidade? Essa é a pergunta central de uma dissertação de mestrado apresentada na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), que analisa como o Estado brasileiro pune atos considerados irregulares na administração pública.

No trabalho “Direito Administrativo Sancionador: imputação penal e principiologia no enfrentamento à improbidade administrativa no Brasil”, o pesquisador Lysandro Alberto Ledesma defende que o combate à corrupção precisa ser firme, mas não pode abrir mão de regras claras, provas consistentes e respeito aos direitos fundamentais.

De forma direta, o estudo alerta para um risco concreto: punir agentes públicos apenas por erro, má gestão ou interpretação divergente da lei, sem comprovar que houve vontade consciente de agir de forma ilegal. Segundo o autor, isso cria medo, paralisa decisões administrativas e fragiliza a segurança jurídica.

A pesquisa explica que existe um ramo do direito chamado Direito Administrativo Sancionador, que trata das punições aplicadas pelo Estado fora do direito penal tradicional, como multas, perda de cargo e suspensão de direitos políticos. No caso da improbidade administrativa, essas punições são especialmente graves e só podem ser aplicadas pelo Judiciário.

Por isso, o autor sustenta que, quando o Estado pune alguém por improbidade, deve seguir princípios semelhantes aos do direito penal: ampla defesa, contraditório, proporcionalidade e, principalmente, a comprovação de intenção de cometer o ato ilegal. Em outras palavras, não basta que o ato tenha dado errado — é preciso demonstrar que houve vontade de violar a lei.

Para fundamentar essa análise, o estudo examinou decisões recentes do Tribunal de Justiça de Mato Grosso e constatou que ainda há grande variação nos critérios usados pelos julgadores para reconhecer ou negar a existência de intenção (o chamado “dolo”). Em alguns casos, a punição ocorre mesmo quando a prova dessa intenção é frágil ou inexistente.

A dissertação defende que o direito penal deve continuar sendo o último recurso do Estado, usado apenas nos casos mais graves. O direito administrativo sancionador, por sua vez, não pode ser mais severo ou menos rigoroso nas provas do que o próprio direito penal, sob pena de inverter a lógica do sistema de justiça.

Outro ponto central do trabalho é a necessidade de critérios claros de prova. Segundo o autor, sem padrões objetivos para avaliar documentos, depoimentos e condutas, abre-se espaço para decisões arbitrárias, insegurança jurídica e uso político da lei de improbidade.

Nas conclusões, o estudo afirma que proteger a sociedade contra a corrupção não significa flexibilizar garantias legais. Pelo contrário: punições bem fundamentadas, com provas sólidas e critérios claros, fortalecem a justiça, a democracia e a própria credibilidade do combate à improbidade administrativa.

Referência

LEDESMA, Lysandro Alberto. Direito Administrativo Sancionador: imputação penal e principiologia no enfrentamento à improbidade administrativa no Brasil. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2025.

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