Contratos Administrativos: Sistema gerencial

A Constituição Federal  de 1988 ao disciplinar a Administração Pública dispôs sobre os servidores públicos nos artigos 39, 40 e 41 e estabeleceu regras gerais nos artigos 37 e 38. 

A Reforma Administrativa pautada nos princípios basilares da supremacia do interesse público e a indisponibilidade do interesse público impuseram a transformação de um sistema de Administração Pública burocrática para um sistema gerencial, apresentando como características: privilegiar a população, os direitos públicos e a obtenção de resultados, outorgando aos agentes públicos confiança, porém sob controle legal e responsabilização.

Uma vez realizado o processo licitatório, obtendo a proposta mais vantajosa, tem-se a empresa declarada vencedora, a homologação da licitação, a adjudicação do objeto, e a convocação desta para assinar o contrato administrativo com a Administração Pública, o qual será regulado pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público:

Art. 54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado.

 § 1º Os contratos devem estabelecer com clareza e precisão as condições para sua execução, expressas em cláusulas que definam os direitos, obrigações e responsabilidades das partes, em conformidade com os termos da licitação e da proposta a que se vinculam.

(art. 54 da Lei nº 8.666/1993).

Lembrando que nos contratos em que a Administração Pública é parte, faz-se presente o princípio da supremacia do interesse público ao privado, o que gera certos benefícios ou prerrogativas ao ente estatal conforme a Lei nº 9.784/1999[6], no caput do art. 2°:

Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

I – atuação conforme a lei e o Direito;

II – atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei;

III – objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades;

IV – atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé;

V – divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição;

VI – adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público;

VII – indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;

VIII – observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados;

IX – adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados;

X – garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio;

XI – proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei;

XII – impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados;

XIII – interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação.

Por força desse princípio, existindo conflito entre interesse público e particular, deverá prevalecer o interesse do Estado; todavia, a Administração deve seguir estritamente a lei, evitando qualquer tipo de abusos e confrontos com outros princípios constitucionais e garantias fundamentais.

Cláusulas obrigatórias e exorbitantes

A Lei de Licitações e Contratos, por sua vez, traz o conceito de contratos administrativos (art. 2º): “contrato é todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas’’. É, pois, a relação jurídica entre a Administração e o particular.

Nos contratos administrativos, observa-se a fixação do objeto, das obrigações, dos direitos, das garantias e outras disposições necessárias, contendo cláusulas obrigatórias e de cláusulas exorbitantes.

As cláusulas obrigatórias, também conhecidas como necessárias ou essenciais, são aquelas conforme dispõe o art. 55 da Lei nº 8.666/93, na íntegra, abaixo:

Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:

I – o objeto e seus elementos característicos;

II – o regime de execução ou a forma de fornecimento;

III – o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;

IV – os prazos de início de etapas de execução, de conclusão, de entrega, de observação e de recebimento definitivo, conforme o caso;

V – o crédito pelo qual correrá a despesa, com a indicação da classificação funcional programática e da categoria econômica;

VI – as garantias oferecidas para assegurar sua plena execução, quando exigidas;

VII – os direitos e as responsabilidades das partes, as penalidades cabíveis e os valores das multas;

VIII – os casos de rescisão;

IX – o reconhecimento dos direitos da Administração, em caso de rescisão administrativa prevista no art. 77 desta Lei;

X – as condições de importação, a data e a taxa de câmbio para conversão, quando for o caso;

XI – a vinculação ao edital de licitação ou ao termo que a dispensou ou a inexigiu, ao convite e à proposta do licitante vencedor;

XII – a legislação aplicável à execução do contrato e especialmente aos casos omissos;

XIII – a obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação.

§ 1o (VETADO)

§ 2º Nos contratos celebrados pela Administração Pública com pessoas físicas ou jurídicas, inclusive aquelas domiciliadas no estrangeiro, deverá constar necessariamente cláusula que declare competente o foro da sede da Administração para dirimir qualquer questão contratual, salvo o disposto no § 6o do art. 32 desta Lei.

§ 3º No ato da liquidação da despesa, os serviços de contabilidade comunicarão, aos órgãos incumbidos da arrecadação e fiscalização de tributos da União, Estado ou Município, as características e os valores pagos, segundo o disposto no art. 63 da Lei nºo 4.320, de 17 de março de 1964.

FARAO

Fonte: ENAP – Escola Nacional de Administração Pública

No tocante às cláusulas exorbitantes, consideradas prerrogativas concedidas à Administração Pública por atuarem com supremacia em prol do interesse público, sendo caracterizadas pelo regime predominante do direito público, a aplicação supletiva das normas de direito privado e o desequilíbrio contratual em favor da Administração. 

As cláusulas exorbitantes são aquelas exclusivas da Administração Pública, prevendo alterações unilateral do contrato, rescisão, fiscalização e aplicação de sansão, dispostas no art. 58 da Lei 8.666/1993, veja-se:

Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:I  – modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;II – rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei;III – fiscalizar-lhes a execução;IV – aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste;V – nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo.§ 1º As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado.§ 2º Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual.

O artigo 58 da Lei 8.666/1993 é o que elenca a maioria das cláusulas exorbitantes, embora existam outras dispersas pela lei, como: i) a exigências de garantias pela Administração (art. 56) e ii) a restrições à oposição, pelo contratado, da exceção do contrato não cumprido (art. 78, XV). 

Alteração Unitateral (art. 58, II):

Pautada no principio do interesse público, permitindo a Administração a alteração unilateral das cláusulas do contrato independentemente do consentimento do contratado, mediante motivação, respeito a natureza do contrato e objeto. O artigo 65, inciso I da Lei 8.666/93 estabelece os casos em que a alteração unilateral é possível.

Rescisão unilateral (art. 58, II)

 A prerrogativa de rescindir unilateralmente os contratos administrativos repousa nas hipóteses dispostas no art. 78, incisos I a XII e XVII, como o: i) descumprimento injustificado de cláusulas contratuais por parte do contratado, ii) a respectiva decretação de falência, iii) razões de interesse público, de alta relevância e amplo conhecimento, iv) ocorrência de caso fortuito ou de força maior, regularmente comprovada, impeditiva da execução do contrato. Destaca que quando a rescisão unilateral decorrer de irregularidades imputadas ao contratado, deve ser precedida de processo administrativo em que se assegure o direito ao contraditório e à ampla defesa.

Fiscalização da execução do contrato (art. 58, III)

Trata-se de um poder-dever da Administração, por meio de um representante designado, de acompanhar e fiscalizar a execução do contrato. O contratado, por sua vez, deverá manter preposto, aceito pela Administração, no local da obra ou serviço, para representá-lo na execução do contrato (art. 68). Ressalta-se que a fiscalização efetuada pela Administração não exclui a responsabilidade do contratado pelos danos causados a terceiros decorrentes de sua culpa ou dolo na execução do contrato (art. 70).

Aplicação de sanções (art. 58, IV)

A prerrogativa de aplicar sanções de natureza administrativa ao contratado, caso este deixe de cumprir total ou parcialmente o objeto do contrato. As sanções que podem ser aplicadas pela Administração são: i) Advertência (art. 87, I); ii) Multa, por atraso na execução do contrato (art. 86) ou na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato (art. 87, I); iii) Suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos (art. 87, III); iv) Declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública (art. 87, IV). A pena de multa pode ser aplicada cumulativamente com qualquer uma das outras. Por outro lado, é vedada a acumulação das demais sanções entre si.

Ocupação de bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados

 ao objeto do contrato, quando o ajuste visa à prestação de serviços essenciais (art. 58, V):

A prerrogativa de ocupação temporária decorre do o princípio da continuidade do serviço público, quando o objeto do contrato for a prestação de serviços essenciais, e ocorre nas seguintes hipóteses: i) como medida cautelar no decurso da apuração administrativa de faltas cometidas pelo contratado; ii) após a rescisão do contrato administrativo.

Exigências de garantias pela Administração (art. 56)

 Pauta-se na facilidade de ressarcimento dos prejuízos causados pela eventual inexecução do ajuste. É decisão discricionária da Administração, que para que possa ser exigida, deve haver previsão expressa no instrumento convocatório da licitação (edital), nos termos do art. 56 da Lei 8.666/1993.

Restrições à oposição, pelo contratado, da exceção

do contrato não cumprido (art. 78, XV):

Sob a prerrogativa do princípio da continuidade dos serviços públicos, no caso de não pagamento por parte da Administração Pública, somente após 90 dias de atraso é que o particular contratado pode demandar a rescisão do contrato administrativo ou, ainda, paralisar a execução dos serviços, após notificação prévia.

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